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Agatha Christie, a rosa e o teixo

O momento da rosa / e o momento do teixo / têm igual duração. A frase, parte de um poema de T.S. Eliot, abre um dos livros que Agatha Christie assinou como Mary Westmacott, pseudônimo que a Rainha do Crime escolheu para usar em suas obras não policiais. Os versos de Eliot, aliás, também batizam o título original do livro: The Rose and the Yew Tree (A rosa e o teixo). Mas sendo o teixo uma árvore encontrada na Europa e Ásia e não muito familiar no Brasil, o título soaria meio estranho pra gente. Daí a opção em dar-lhe o nome de “O conflito” (e logo você descobre que ele é totalmente pertinente). Mas voltando ao assunto, para os que estão loucos para saber como é, afinal, o teixo, aí vão algumas características: ele é uma árvore com complexo de arbusto, com folhas meio espinhentas e frutos venenosos. Forte e resistente, os arcos de Robin Hood teriam sido feitos com a sua madeira, já que ela era a mais utilizada para este fim nos idos tempos ingleses. Apesar do teixo não ser lá muito bonito, ele pode ganhar um trato e ficar bastante apresentável, pois ele se presta perfeitamente para aquelas esculturas arbóreas dos clássicos (e nobres) jardins britânicos. No livro de Agatha Christie, o teixo representa o personagem John Gabriel, um ambicioso e oportunista herói de guerra, enquanto a rosa do título original simboliza Isabella Charteris, a mocinha que se apaixona por ele e fica dividida entre o compromisso de se casar com um primo e o amor por Gabriel que, apesar de corresponder aos seus suspiros, também entra em conflito. Pra saber se eles acaba dividindo o mesmo jardim, só lendo o livro pra descobrir.

Um escabelado teixo que, pelo tamanho, deve ter muitos anos de vida

Além de O conflito, de Mary Westmacott / Agatha Christie, a Coleção L&PM Pocket também publica Ausência na primavera, Retrato inacabado e Filha é filha.

O retrato de Agatha Christie

“Em Celia, muito mais do que em qualquer outro personagem, nós temos um retrato de Agatha”. A frase, de Max Mallowan, o segundo marido de Agatha Christie, refere-se à personagem de Retrato inacabado, seu segundo romance não policial, publicado sob o pseudônimo de Mary Westmacott.

No livro, Celia é uma bela e interessante mulher que, numa ilha exótica, encanta Larraby,  um célebre pintor de retratos. Ao perceber que ela está prestes a cometer um ato extremo, o artista resolve escutar sua história e, a partir daí, elabora o retrato de Celia não com pinceladas, mas com palavras. E assim, ele reconstrói sua vida desde o nascimento até os dias atuais. “Celia era uma garotinha séria. Ela pensava um bocado sobre Deus e sobre ser boa e pura. Quando puxava um ossinho da sorte, sempre desejava ser boa. Celia era sem dúvida uma puritana, mas ao menos guardava seu puritanismo para si. Às vezes tinha um medo horrível de ser ‘mundana’ (palavra misteriosa e perturbadora!), em especial quando toda vestida de musselina engomada e com uma grande cinta amarelo-ouro, pronta para descer para a sobremesa. Mas no geral vivia complacentemente satisfeita consigo mesma. Ela era uma das eleitas. Estava salva” (Trecho de Retrato inacabado).

Será que a garotinha Agatha era assim também? Séria ela provavelmente era, como mostra a foto abaixo:

Escrito sob o pseudônimo de Mary Westmacott, e lançado pela primeira vez em 1934 na Inglaterra, Retrato inacabado  é considerado um romance “semi-biográfico” de Agatha Christie. A escritora conseguiu manter por quinze anos o segredo de seu pseudônimo e, ao todo, publicou seis romances assinados com este nome. A L&PM já publica três deles.

Agatha Christie tinha outra por dentro

Agatha também era Mary. Não apenas Agatha Mary Clarissa Miller (que ao casar tornou-se “Christie”), mas também Mary Westmacott. Esse foi o pseudônimo escolhido para seus livros não policiais. Um nome que, aliás, Agatha nunca explicou exatamente de onde veio. O Mary é seu segundo nome. Mas e o Westmacott? Seria o sobrenome uma homenagem a Richard Westmacott, o famoso escultor britânico, autor do Vaso Waterloo que encontra-se no Palácio de Buckingham? Ela nunca deixou muito claro… Agatha escreveu seis romances sob esse pseudônimo (estreou como Mary em 1930), os primeiros livros sem que ninguém soubesse que era ela. Em sua autobiografia, a escritora falou sobre isso:

O que eu gostaria de fazer, agora, seria escrever um livro que não fosse policial. De modo que, com certo sentimento de culpa, diverti-me escrevendo um romance chamado Entre dois amores [Giant´s Bread]. Era sobretudo a respeito de música, e desvendava, aqui e ali, que eu possuía alguns conhecimentos técnicos no assunto. A crítica foi boa e vendeu-se razoavelmente para o que era considerado “primeiro livro”. Usava o pseudônimo de Mary Westmacott e ninguém sabia que o livro fora escrito por mim. Consegui conservar esse fato por 15 anos.

Escrevi outro livro sob o mesmo pseudônimo, um ou dois anos mais tarde, chamado Retrato inacabado  publicará este livro com o título de O retrato inacabado]. Só uma pessoa suspeitou de meu segredo: Nan Watts – agora Nan Kon. Nan possuía boa memória, e alguma frase que eu empregara acerca de umas crianças e um poema no primeiro livro atraíram sua atenção. Imediatamente disse para consigo “Tenho certeza de que foi Agatha quem escreveu isto.”

Um dia, cutucou-me as costelas e disse, num tom de voz levemente afetado: “Outro dia li um livro seu de que gostei muito; agora, deixe-me ver – como era mesmo o título? O Sangue dos amores, é isso, sim!” E piscou o olho para mim da maneira mais maliciosa. Quando a levei para casa, disse-lhe: “Conte-me agora – como foi que você descobriu a respeito de Entre dois amores?”

“É claro que eu sabia que foi você. Conheço sua maneira de falar”, disse Nan.

De tempos em tempos, eu escrevia canções, baladas sobretudo – mas não fazia a menor ideia de que teria a sorte estupenda de entrar em outro setor da arte literária inteiramente diferente e de que o iria fazer, ademais, numa idade em que já não é fácil empreender novas aventuras.

A Coleção L&PM Pocket publica todos os seis títulos de Agatha Christie como Mary Westmacott: Ausência da Primavera (um dos livros preferidos de Agatha sob o pseudônimo de Mary); Filha é filha (que, segundo sua única filha, Rosalind, foi baseado na relação entre ela e sua mãe); Retrato inacabado; O fardo; O conflito e Entre dois amores.

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O romance de Agatha Christie com William Shakespeare

Acaba de chegar à L&PM o livro Ausência na primavera de Mary Westmacott, pseudônimo escolhido por Agatha Christie para publicar uma série de romances escritos entre 1930 e 1956.  Poucos conhecem este outro lado da Rainha do Crime. O livro, publicado em 1944 na Inglaterra, explora a alma humana, seus conflitos e emoções.

Uma curiosidade interessante desta obra: Agatha buscou em William Shakespeare inspiração para o romance. Além do Soneto 98 From you I have been absent in the spring, que dá nome ao livro, há várias citações de Shakespeare na trama. “O mercador de Veneza”, “Cimbeline” e os Sonetos 18 e 116 estão por lá. Um dos personagens centrais da trama, chama-se…adivinhem! William! Seria uma homenagem? A escritora Paula Taitelbaum fez uma tradução livre do soneto 98. Deleitem-se!

 

Soneto 98 – De você estive ausente na Primavera

 

De você estive ausente na Primavera

Quando abril chegou e despediu-se de suas heras

Vestindo com espírito jovem tudo o que via

Rindo e saltando como se Saturno fosse pura alegria

 

Tão indefinível o quente canto adocicado das aves

O odor e a cor das flores que surgiam suaves

Nenhuma história de verão poderia isso contar

Pois seu orgulho a brandura do colo iria arrancar

 

Nem mesmo sei por que o lírio branco eu escolhi

Por que a vermelhidão da rosa eu não preferi?

Troquei a doçura pela soma do prazer

Terminamos em empate, ser versus não ser

 

No entanto, o inverno ainda geme e você continua ausente

Somente sua sombra brinca em minha frente